segunda-feira, 8 de outubro de 2007

Todos são publicitários...

Um amigo publicou a seguinte crônica no seu blog, abre aspas
Biscoito da Sorte
Como muitos sabem, eu sou médico.
E acabo de receber um "presente" de um laboratório farmacêutico: uma caixa com 45 biscoitos da sorte.
Quem nunca viu um biscoito da sorte, cuidado ao mordê-los: o papel dentro, com a mensagem filosófica, às vezes entra entre os dentes, causando uma profunda ferida na gengiva.
O propósito do presente era o seguinte: em cada consulta eu prescreveria ao paciente um certo hidratante que eles estão desesperados para vender. E mostraria ao paciente a caixa, oferecendo um biscoito da sorte. Dentro dos biscoitos, ao invés de mensagens, dicas de como manter a pele hidratada.
Estão achando piegas? Nem comecei.
O paciente comeria um biscoito. Leria a baboseira dentro dele. E um desses 45 biscoitos teria a seguinte mensagem: "parabéns, você acaba de ganhar um hidratante". Assim, eu daria ao paciente ganhador o tal hidratante.
Até que é um bom hidratante.
Como adoro o sabor dos biscoitos da sorte, que me lembram liglig vendido nos sinais de trânsito, tratei logo de comer o primeiro. E fui sorteado, para infelicidade do propagandista, que não poderia me dar outra caixa.
Tudo por água abaixo. Na cabeça do vendedor de hidratantes, eu não prescreveria mais 45 vezes o hidratante. Ele não venderia os creminhos e perderia o emprego, numa cascata de pensamentos pessimistas.
Claro que eu comeria os 45 biscoitos. À propósito, já engoli uns vinte, sem ler as baboseiras dentro deles.
E custa-me crer que essa gente da indústria farmacêutica acredite que eu, em cada consulta, faria um sorteio, tendo que lidar com 44 frustrados (no máximo) que não ganharam o hidratante.
As coisas não se misturam, não nas minhas consultas. E trato de exercer meu trabalho intelectual de responsabilidade sem muitas interferências ou tendências.
O frasco de hidratante em gel já está na minha bolsa, afinal, eu mesmo ganhei e não estou sendo desonesto.
Mas alguns biscoitinhos estão meio moles, pois estavam guardados no porta-malas do sujeito. Acho que vou largá-los por aqui. fecha aspas


Como a gente vive imaginando e sonhando com um mundo melhor: parem de querer ser publicitários...todos que não tem o menor respeito pela inteligência alheia escolham outra profissão...político talvez, sem ofensas....

Todos, mas todos sem excessão se acham publicitários. Os clientes, a tia do cliente, a famosa sobrinha do cliente. Todos sabem fazer publicidade, promoção, merchandising e textos. Ah! os textos. Os redatores estão acabando por causa do cliente/redator e da informática.


Quando você entra na sala para o briefing ele fala: preciso de um texto de impacto...penso comigo mesmo (segura essa!). E ele: Dá uma lida. Quando cliente fala isso é fatal, esse é o texto. Vc pode vir com a cois a mais genial do mundo. Esse é o texto e a imagem vai ser a sobrinha.

Então não façam os coitados dos médicos de idiotas. Vocês não são, eu não sou. Publicidade não é isso.
Como publicitário e por profissão anterior, sempre trabalhei muito com a indústria Farmacêutica, em especial na Contraste Propaganda, com o mestre Fernado Loureiro. Sempre acreditamos na importância do médico na construção da marca. Ele é o formador de opinião, o cara que tem conhecimento e pensa. O médico não precisa distribuir biscoitinhos. Precisa como, diz o médico no texto aí em cima é dizer que o produto é bom. E ele atesta isso. A promoção é que é ruim. As idéias é que são ruins, idiotas até.

Portanto, vamos deixar medicina para os médicos e publicidade para quem estuda isso. Meu chefe ontem disse uma frase ótima. Um cliente o chamou e pediu a ele uma cartinha para comunicar importante modificações. Resposta: Cartinha você faz, para fazer uma você não precisa de mim. Se quiser um planejamento e ações de comunicação eu trabalho com você.

Doutor, obrigado mais uma vez.

2 comentários:

Bruno de Faria - Dermatologista disse...

Paulo, nem fazes idéia do que o marketing farmacêutico é capaz para impôr seus produtos, nem sempre de procedência qualificada. Vai da situação esdrúxula dos biscoitos da sorte ao suborno, passando por presentes ingênuos, como passagens aéreas e inscrições em congressos. Escreverei mais sobre isto hoje.

Unknown disse...

Prezado Dr. Paulo:

A ação promovida pelo laboratório não foi boa. De fato, ruim mesmo, foi essa idéia. Infelizmente nem toda indústria farmacêutica se relaciona corretamente com a classe médica e nem toda a agência que atende ao segmento está apta a atender a conta, criando ações promocionais desastrosas como esta. Minha opinião é que ambos têm culpa. Em geral, o que sustenta a permanência de agências não qualificadas junto aos laboratórios e, a conseqüente aprovação de idéias infelizes por parte do laboratório é aquele antigo critério do menor preço, sem uma avaliação do custo vs benefício. Enquanto o que leva uma agência a atender contas na indústria é o seu ingresso num mercado em que os clientes são multinacionais e por isso dão uma falsa idéia de que o faturamento para a agência será alto. Ledo engano. No segmento de produtos éticos não há veiculação a não ser em mídia dirigida. A maior parte da verba dos produtos é consumida nas amostras grátis, em programas de educação médica continuada, simpósios e congressos médicos (aqui, além do espaço alugado ao organizador, entra o stand, passagens e hospedagens para os médicos patrocinados) e, finalmente, material promocional (impressos) usados pelos propagandistas.

Em verdade, o que acontece na prática do mercado é que há agências aventureiras e gerentes de produto na indústria despreparados para o cargo. Reina uma confusão entre avaliação do que pode ser inédito e o que pode ser ridículo para o seu produto. Para confirmar isso, basta freqüentar alguns congressos onde os laboratórios travam batalhas para chamar a atenção do target que lá circula, implementando ações impróprias que acabam por imbecilizar o médico.

Sem conhecimento e avaliação profunda sobre o que vem a ser a propaganda de produtos éticos não se faz grande coisa.